Dica do Réu: “A missa de Milton Nascimento, a Missa dos Quilombos”

Você já foi em uma missa afro? Sabe como acontece? Nosso querido Milton trouxe todas as sensações, clima, ambiente e ritos pra um Disco. O universo Banto, Nagô-Jeje, o mundo católico, sua engenhosidade, talento e conhecimento, foram usados para  compor, arranjar e reger toda essa missa!

Gravado em março de 1982 ao vivo, em 3 noites, na Igreja da Nossa Senhora mãe dos Homens Caraça, um bela igreja diga-se de passagem. A missa que se ouve nesse disco não é uma entonação de cânones da religião católica, é sim uma celebração da ressurreição do povo negro.

A de ó (Estamos Chegando)

“…Estamos chegando da morte dos mares,

estamos chegando dos turvos porões,

herdeiros do banzo nós somos,

viemos chorar…”

É assim que o Sr. Milton começa a missa, essa música, Aliás usei em um dos meus singles “Banzo”. Essa canção é um chamado, na verdade um anuncio de onde estamos e como estamos chegando.

Em Nome de Deus

“…Em nome do Povo,

Que fez seu Palmares,

Que ainda fará

Palmares de Novo.

Palmares…. Palmares….”

Com todas as músicas compostas pelo próprio Milton, esse disco ou essa missa, talvez represente o Disco mais “EMPODERADO”, usando um termo do momento, da década na música popular, sendo lançado em plena censura da ditadura aos movimentos sociais e artísticos.

O disco conta com altos “Coros” da música sacra católica e muitos tambores, agogôs, cuícas numa mistura de ritmos afrobrasileiros. O Lado A do Discos tem as músicas A de Ó, e RIto Penitencial como destaque, sendo também a faixa “Em nome de Deus” um deleite com um solo do Milton.

Encarte álbum
Encarte interno do LP

A primeira faixa do Lado B “Aleluiá” é pra você se sentir no terreiro!

“Rito de Passagem” toca numa pegada mais de Marcinha e pausa para um solo pesado acompanhado de um bem tocado Violão.

“Louvação a mariama” é o brilho do CD, pela letra, solos de percussão e a gravação. E falando em gravação só quem tem o Vinil vai poder ler o que o “Mazola” produtor desse LP disse do desafio de gravar em uma igreja, sobre a acústica, testes, enfim, confiram alguns trechos;

…O problema era encontrarmos um local onde a sonoridade externa não prejudicasse a gravação…”

“… No fim do dia a conclusão foi quase desanimadora…”

“… Colocamos 1 Bateria, 4 atabaques, 1 percussão, 11 vozes 1 guitarra, 1 contrabaixo  e teclados, todos juntos tocando. A reverberação foi terrível…”

“… Pedimos ao padre tobias que nos fornecesse 60 colchões de espuma e 80 cobertores, teríamos que amortecer a reverberação dos instrumentos… No fim da noite 60% do som foi alcançado…”

“… No outro dia recomeçamos… E foi quando fizemos o primeiro ensaio para os ajustes finais… Que disse emocionado ao Milton: Conseguimos…”

Esse disco é um jóia pra quem ama e quer conhecer Milton Nascimento, a cultura Negra, o Sincretismo e também a habilidade técnica e sonora captada nessas 3 noites inesquecíveis de gravação.

Palmares o Sinai Negro, Zumbi, o Moisés Negro

Dica do Réu – Earth, Wind & fire: o afrofunkfuturista inspirado no Brasil e no Egito

Com um som muito harmônico, pesado e cheio de Hits, O Earth Wind & Fire, também se destaca pela estética visual dos seus álbuns, que hoje popularmente chamamos de afrofuturismo.

O álbum de hoje na nossa resenha e café é o “All in All“, ou em tradução livre todo no todo, ou tudo in tudo.

Lançado em novembro de 1977, o álbum merecidamente vendeu mais de 3 milhões de cópia e ganhou uma versão remasterizada em 2002.

O melhor, é que todo o projeto do álbum, foi pensado por Maurice White após uma viagem q fez a Argentina e ao Brasil.

Musicas do álbum foram usadas em varios samplers dos nossos grupos prediletos, entre eles, Grandmaster Frash e o Furious Five, 2Pac e também o Fugges.

Os destaques do disco  ficam por conta do hit “Fantasy”, acompanhado das músicas que homenageiam o brasil, chamadas de “Brazilian Rhymes”.

São elas a Beijo, que você já ouviu por ai, cheia da nossa ginga e groove,  com um baixo que só falta falar e uma abertura de voz delicadamente bem feita.

No final da track “Runim”, começa um samba de avenida, estilo escola de samba, o percussionista brasileiro Paulinho da costa deixa sua marca no disco, alias esse não é o primeiro álbum que resenho e ele está.

Na segunda “brazilian rhymes” eles interpretam a música ponta da areia de Milton nascimento.

Musicalmente o disco traz talvez as guitarras mais bem feitas do funk, antes dos clássicos produzidos por Michael Jackson e ascensão do Prince. Os metais quase onipresentes em todo o álbum, mostram a criatividade de Maurice na criação dos arranjos e na habilidades dos músicos na execução. Ah… Sintetizadores Moog são fáceis de serem ouvidos neste trabalho.

Termino falando da capa que é fenomenal, traz o Egito, que marca toda a trajetória discográfica da banda. Porém, nesse disco com tons de modernidade, têm naves partindo das pirâmides, uma memphis moderna, high tech contrastando com construções antigas.

Recomendo que ouça esse Álbum com um bom fone ou sistema de som pra não perder nada, porque melhor q ele, só mesmo o show ao vivo da banda, que ao final era engolida pela pirâmide egípcia que descia no palco (INCRÍVEL)!

Dica do Réu – O Brasil do repente que não conhecemos!

Sabe quando você ouve uma música que você não tem tanta familiaridade, mas sabe que faz parte de você? É isso que senti ao ouvir o LP “Coletânea de Repentistas Vol. 2” da Série Brasil Caboclo, lançado em 1981. Esse disco que peguei de uma pilha de disco na casa do meu amigo e irmão Mamuti.

Pra quem acha que a cultura produzida no norte, nordeste e interiores do país, como a literatura de cordel e musicalmente falando, as cantigas e prosas do repente, nunca viu uma viola caipira com suas 10 cordas formando quase um “Chorus” natural a cada dedilhada, Ou, nunca prestou atenção na construção dos versos de um repente, nesse vinil temos por exemplo a música “Quadrão paulista”, se liga na sua estrutura:

“estrofes de 8 versos, com 7 sílabas, o 1º rima com o 2º e 3º, o 4º rima com o 5º e o último termina com a pontinha “ista” pra rimar com a palavra paulista (ouça o som na nossa playlist abaixo), ah o 6º rima com o 7º”.

Infelizmente achamos pouca coisa desse trabalho na rede, um disco que pelo tamanho curto das músicas, pode manter a qualidade dos áudios no Vinil, muito bem gravado no estúdio “Publi-sol”.

O repente diferente como muitos dizem não foi o antecessor do Rap, ele tem vida própria baseada no encontro do povos Bantos com os nativos brasileiros, e também alguns instrumentos e escritas europeias. Esse trabalho sintetiza muito do que é a vida do sertanejo (não to falando do luan santana) e de geral do brasileiro, tem causos, filosofia, brincadeiras, religião, entre outros assuntos numa dinâmica de pergunta resposta, num dedilhado e ritmo que muitos acadêmicos da música nunca conseguirão fazer.

Pras pesquisas futuras, deixo abaixo link para audição de trechos do disco,  pois como disse não temos muito ou quase nada dele na rede pra ouvir e também, também segue nome dos intérpretes e cantores!

Intérpretes:

João Bezerra

João Quindingues e Oliveira Francisco

Zé Francisco e Andorinha

Guariatã de Coqueiro e João Tavares

Dica do Réu – Tina Turner a contadora de casos no Rock em “Foreign Affair”

Em seu 7º Álbum a poderosa Tina Turner traz uma série de histórias, causos e enlaces amorosos do início ao fim. Diferentemente dos seus álbuns anteriores esse LP só emplacou 2 Hits, a famosíssima “The Best”  e a “Steam Windows”.

O “Foreign Affair”me trouxe uma sensação de ouvir uma Tina Turner numa maturidade e presença muito estável, além de flertar com seu passado no Blues com as Harmônicas (Gaitas) na “Steam Windows”, ou nas letras de amor quase sufocantes, ela se mantem contemporânea e usou muito sintetizadores/Programadores digitais, ouça nas faixas “Look me in the Heart” (na percussão), na “Falling Like Rain” e “Not Enough Romance” (Bateria programada). O que se tornaria algo bem característico do Rap, iniciado pela “Disco”, Tina Turner trouxe pro seu trabalho que em boa parte é influenciada pelo Rock ‘n’ Roll.

Uma coisa muito importante desse trabalho é que a própria Tina assina 2 produções desse LP, a famosíssima “The Best” e “Ask me how i feel”, no qual também compôs os arranjos!

Com uma interpretação impecável no álbum, além de arranjos bem “Funkeados” de resposta dos Backing Vocals, a monstrona Tina Turner mostra como fazer um Álbum para se ouvir de ponta a ponta!!!

E para os amantes, cuidado! O som pode ser sua trilha sonora!

“O rádio estourando no acento da frente

Tornando a música agradável

E nós estávamos nos aninhando no acento de trás

Compensando o tempo perdido”

Foreign Affair

Dica do Réu – Street Songs o álbum Universal de Rick James

Você talvez não esteja muito habituado a ouvir Rick James, ou talvez sinceramente nem o conheça, mas se você é uma ou um daqueles fãs e ouvintes de música negra, produzida pós anos 80 você tem Rick James, e em especial, o álbum “Street Song’s” na sua memória afetiva e musical.

Porque Réu?

Vou te explicar… Esse trampo do Rick James, lançado em Abril de 1981 e que ganhou o Disco de platina apenas 3 meses depois do seu lançamento emplacou mais de 4 Hits. Só pra você ter noção a música “Super Freak” foi tema dos filmes “Pequena Miss Sunshine” e instrumental de uma das cenas do “Batman Begins”. Pouco? Então ai vai… Artistas como DJ Jazzy Jeff  e The Fresh Prince, Common, Jay Z, Mc Hammer, Busta Rhymes, Public Enemy e o mais novo da cena Kendrick Lamar já usaram samplers de canções desse álbum. Se você já jogou Dj Hero também tem Rick James lá.

Ah quer mais? Então vamos com os nossos ídolos da infância e adolescência Claudinho & Buchecha com o som “Xereta”.

Não te falei!? Esse álbum é fenomenal, merecia um textão daqueles, mas vou na síntese aqui pra despertar sua curiosidade.

Considero Street Songs um dos trabalhos musicais mais importantes da primeira metade da década de 80, foi produzido e arranjado pelo próprio Rick James, lançado pela monstruosa Montown, traz uma mistura em todo o disco de arranjos de Baixo (no qual ele aparece na capa do disco e toca em varias músicas), Metais, Guitarras e bateria já com timbres eletrônicos, além do vocal sem defeito e cheio de malícia de Rick. Esse disco foi tão importante que colocou Rick James como o primeiro Negro indicado na categoria “The Best Male Rock Performance” (Melhor performance masculina de rock) no Grammy de 1982. A revista Rolling Stones coloca a música “Super Freak” entre as 500 melhores de todos os tempo.

O funk de Rick James levou o triplo de platina com Street Songs

O álbum tem 4 super canções “Give it To Me Baby”, a minha preferida “Ghetto Life”,  o eterno Sucesso “Super Freak” e a baladinha romântica “Fire and Desire” com o lindo vocal de Teena Marie (em outra resenha falamos dela).

A estética do álbum fala muito da época e de um cenário que nos representa até hoje; a cidade, a rua, o amor, a noite, o abuso policial que ganhou uma faixa pra discutir a questão a pesada e conclamativa “Mr Policerman”:

“hey mr. policeman

hey sr. Policial

i saw you shoot my good friend down

eu vi você atirar o meu bom amigo para baixo

he was just havin’ fun

ele estava apenas me divertindo”

Bom, prometo fazer um vídeo pra falar mais desses álbum, mostrar os samplers que usaram desse trabalho, detalhes de arranjos vocais, instrumentais e bastidores! 

Montei uma playlist massa com algumas músicas do Disco e também de outros músicos que se inspiraram e samplearam canções desse trabalho.

Termino dizendo o óbvio, Rick James abriu caminho na Montown para o trabalho de Michael Jackson seja na sonoridade, no marketing, na pegada pop, mas funk, raiz, pesada, na estética, no seu cabelo louco, e também nos seus maravilhosos e irreverentes vídeo Clipes.

PLAY

Dica do Réu – Diana Ross em “Mahogamy”

Salve Queridas e queridos, bom compartilhar novamente com vocês as minhas impressões, pesquisas e emoções dos meus discos de Vinil. Pra você que queira saber um pouco dos outros trabalhos que já escrevi acesse o site do Moozyca que lá tem outras resenhas e dicas.

Cartaz de divulgação do Filme “Mahogamy”, onde Diana Ross interpreta uma jovem negra e pobre de Chicago que realiza seu sonho de ser estilista

Bem, o LP que quero apresentar hoje é um daqueles discos de Trilha sonora de Filme, o não fabuloso “Mahogany”, filme de 1975, que além de ter dado treta por todos os lados, entre o fundador da Montown, Berry gordy e o diretor do filme, entre Diana Ross e Berry, levando Ross a abandonar o set e ter suas cenas finais feitas por uma Dublê, bafo total, não levou o publico em peso ao cinema!!!

Esse Álbum saiu um ano depois do filme, em 1976. produzido e composto por Michael Masser que tem em seu currículo composições e produções para Whitney Houston e George Benson, com participação e co-produção de Jermaine Jackson, isso, aquele mesmo do Jackson Five, nas músicas “Erucu” e “She’s the Ideial Girl”, que particularmente são minhas favoritas pelo Groove. Destaque também para a track “My Hero is a Gun” pela dinâmica do som e forma que pra quem é famíliar do rap e produção de beats, parece que foi feita especialmente pra nós

Sem dúvida nenhuma o grande sucesso do Disco é o tema “Theme from Mahogany (Do You Know Where You’re Going To)”, gravada e lançada por Telma Houston em 1975, mas com auge e sucesso na voz de Diana Ross, Indicada no Academy Award de 1976 para as categorias de Best Music e Original Song.

Diferente dos Lp’s chatissimos de trilha sonora de filmes esse trabalho nos traz a performance em alto rendimento de vários músicos e talentos, transformando esse registro num panorama da época e também da inserção definitiva do negro no cinema, seja como atriz e ator, mas também na composição e direção desse filme.

Bora ouvir?